quarta-feira, junho 23, 2010

Os 23 da Copa (XI) - Robinho: o homem de confiança

Tem alguns garotos aqui no Santos que, se bem trabalhados, vão chegar lá. Por exemplo, o Robinho, um crioulinho. Ele sabe driblar e é inteligente.

No início de 1999, Pelé acompanhava de perto as divisões de base do Santos e cunhou a frase acima, dada em entrevista à revista Placar. É fato que são famosas as apostas e palpites equivocados do Rei, mas nesta ele até que acertou. Robinho, o tal “crioulinho”, tornou-se uma das grandes esperanças do futebol brasileiro em mais uma Copa do Mundo.

Apenas três anos depois da “profecia”, ele foi promovido aos profissionais do Santos, com apenas 18 anos. A seu lado, outras promessas das categorias de base, como o meia Diego, um ano mais novo e seu parceiro inseparável dentro e fora de campo. A bem da verdade, nada disso fez parte de um planejamento meticuloso e profissional; o clube, afundado em dívidas e sem ter como investir em jogadores famosos, tinha nos juniores uma opção (muito) mais barata. E assim o Peixe entrou no Brasileiro de 2002, com um elenco desconhecido e apontado por muitos como forte candidato ao rebaixamento.

Porém, tão logo a bola rolou, descobriu-se um timaço. E aquela equipe comandada por jogadores jovens e/ou pouco conhecidos, como Alex, Maurinho e Alberto, aliados a outros que já estavam na Vila Belmiro sem chamar muito a atenção, casos de Elano e Renato, acabou conquistando de forma brilhante o título brasileiro.

As grandes estrelas da inédita conquista, que pôs fim a um incômodo jejum de dezoito anos sem um título oficial importante, foram justamente os garotos Diego e Robinho. Este, ao comandar a equipe na dramática final contra o odiado arquirrival Corinthians, virou estrela da noite para o dia. Com o companheiro Diego saindo contundido logo a 2 minutos de jogo, Robinho chamou a responsabilidade para si. Construiu os três gols da vitória, sendo que no primeiro conseguiu um pênalti após humilhar o lateral-direito Rogério com uma impressionante e inesquecível seqüência de “pedaladas”, o famoso drible em que se passa seguidamente o pé sobre a bola, imitando o movimento usado em uma bicicleta.

Integrado ao time das estrelas do futebol brasileiro, Robinho logo passou a ter seu lugar exigido pela opinião pública na Seleção Brasileira, talvez de forma prematura. Embora habilidosíssimo e veloz nos dribles, ainda demonstrava uma certa fragilidade física e deficiência nas conclusões a gol. Depois de se destacar na Libertadores de 2003, levando o Peixe ao vice-campeonato, mergulhou em uma má fase, que se estendeu do Brasileiro daquele ano (em que seu clube, teoricamente dono do melhor elenco, acabou perdendo o título para o Cruzeiro) ao Torneio Pré-Olímpico do Chile, em 2004 (o favoritíssimo Brasil naufragou no quadrangular final e perdeu a vaga nos Jogos de Atenas).

O parceiro Diego foi embora, negociado com o Porto. O técnico Emerson Leão também, chegando Wanderley Luxemburgo para seu lugar. E Robinho logo voltou a exibir seu melhor futebol com o novo treinador. Iniciou um trabalho de fortalecimento físico, visando torná-lo um jogador mais resistente às divididas e ao jogo brusco sem contudo prejudicar sua habilidade e mobilidade; e, cobrado energicamente por Luxa, passou a treinar com afinco as conclusões. O resultado foi que ainda ficou longe de ser um emérito finalizador, mas certamente seu aproveitamento tornou-se bem mais aceitável; tanto que, com 21 gols, acabou sendo o artilheiro santista no Brasileiro de 2004, ao lado do centroavante Deivid.

E foi na reta final daquela mesma competição que viveu o maior drama de toda sua vida. Sua mãe, Dona Marina, foi seqüestrada e passou aproximadamente quarenta dias em um cativeiro. Afastado da equipe durante esse período, contou com total apoio de seus companheiros e também da torcida. Só retornou na última rodada da competição, diante do Vasco, apenas dois dias após a libertação de sua mãe, felizmente sem quaisquer marcas (físicas) deixadas pela barbárie. Fora de forma, foi substituído no segundo tempo, festejando depois a conquista de mais um Nacional, o segundo em três anos.

Apenas em 2005 o técnico Carlos Alberto Parreira passou a lhe dar chances reais com a camisa da Seleção principal. E Robinho acabou sendo titular da equipe que conquistou a Copa das Confederações. Não chegou a brilhar como no clube, mas mostrou vários lances de brilho, quase marcando lindos gols tanto contra a Alemanha como contra a Argentina.

Na volta da competição, revelou ter uma proposta concreta do Real Madrid, e que queria ir para a Europa. Julgava já ter encerrado seu ciclo no Santos e argumentava querer dar segurança a sua família, compreensivelmente traumatizada com o lamentável caso envolvendo sua mãe. Após um mês de litígio com o clube, que tentou a todo custo segurá-lo, acabou finalmente negociado por 30 milhões de dólares, um valor certamente compensador diante de tantas outras transações vergonhosas, em que craques brasileiros incontestáveis são negociados a preço de banana (vide os casos Kaká e Diego, por exemplo).

Porém, a fase do clube merengue não ajudou. Robinho chegou no meio de uma crise que se arrastava há três temporadas (e, fora um ou outro espasmo, dura até hoje), tempo em que o Real Madrid tornou-se famoso por suas contratações vultosas e sem critério técnico, que resultam na falta de títulos. Ele próprio acabou por entrar no clima algo "circense" reinante no clube espanhol e foi aos poucos substituindo os gols e dribles objetivos rumo ao gol por um futebol de muitas firulas e irritantemente improdutivo, o mesmo mal que podou a carreira do ex-são-paulino Denilson, outro a trocar o futebol brasileiro pelos milhões espanhóis.

Contudo, seu desempenho na Seleção não foi afetado. Nas chances que recebeu na Copa da Alemanha, houve-se bem e sua entrada no lugar de Adriano foi cobrada por muitos, mas a contusão que o afastou da partida contra Gana nas oitavas-de-final parece tê-lo prejudicado neste objetivo. Voltou da Alemanha sem arranhões na imagem e começou a segunda "Era Dunga" com moral de titular absoluto, que se confirmou com o título, a artilharia (algo inédito em sua carreira) e o posto de melhor jogador na Copa América de 2007, disputada na Venezuela. A partir daí tornou-se definitivamente homem de confiança do treinador.

A má fase no Real Madrid, aliada ao sonho (mais próximo de delírio, no fim das contas) de ser "o melhor jogador do mundo", seguiu atrapalhando-o na Espanha, culminando com declarações desastradas, como as de que preferia "vender pastel na feira" a jogar naquele que é talvez o mais tradicional e historicamente vitorioso clube do planeta. Após fracassar a negociação com o Chelsea, que havia acabado de ser assumido por Luiz Felipe Scolari, foi parar no Manchester City, equipe mais modesta e recém-adquirida por um magnata árabe.

O início na Inglaterra foi bom, com dribles e gols que faziam parecer que a boa fase estava de volta. Mas o desequilíbrio da equipe em campo, com uma defesa muito frágil em comparação com o forte ataque, a campanha consequentemente fraca e a noite de Manchester (com direito a uma controvertida, e depois desmentida, acusação de estupro em uma de suas inúmeras "baladas") fizeram Robinho sucumbir mais uma vez. Reserva, ainda mais depois da chegada de nomes como Bellamy, Roque Santa Cruz e do argentino Tevez, a quem ironica ofuscava quando eram rivais no futebol paulista anos antes, mais uma vez deixou o mau comportamento falar mais alto, com declarações equivocadas de inconformismo via imprensa.

O empréstimo a seu velho e querido Santos caiu como uma luva. Apesar dos apenas 26 anos, chegou para ser o "veterano" da nova geração dos "Meninos da Vila". Seu desempenho em campo está longe de ser decepcionante, colaborando com gols e assistências nas campanhas do título paulista e do "quase-título" da Copa do Brasil (que será decidida contra a "zebra" Vitória após a Copa do Mundo), mas Robinho acabou ofuscado pelas estrelas ascendentes Neymar (quase uma fotocópia dele mesmo anos atrás, mas que aparenta ser ainda mais promissora) e Paulo Henrique "Ganso", este a menina-dos-olhos do torcedor brasileiro e que acabou, após muitas súplicas de convocação, entrando apenas na lista dos sete "suplentes" de Dunga para a Copa.

Na Seleção, apesar de não estar repetindo o mesmo desempenho de 2006/07, Robinho segue com prestígio e titular absoluto de Dunga. Um dos melhores em campo na estreia do Mundial da África do Sul, com direito a uma bela assistência para Elano que fechou a vitória contra a Coreia do Norte, esteve meio sumido diante da truculenta Costa do Marfim. Mas a esperança é que, a partir do difícil confronto contra Portugal, consiga reviver, ao menos em parte, os tempos em que ostentava no futebol brasileiro o prestígio que hoje cabe a seu companheiro de clube Neymar.


Róbson de Souza
atacante
São Vicente (SP), 25.01.1984
1,72 m
65 kg
Clubes: Santos (2002 a 2005 e desde 2010), Real Madrid-ESP (2005 a 2008) e Manchester City-ING (2008/09).
Títulos: paulista (2010) e brasileiro (2002 e 2004) pelo Santos; espanhol (2007/08) pelo Real Madrid; da Copa América (2007) e da Copa das Confederações (2005 e 2009) pela Seleção Brasileira.
Jogos pela Seleção: 88 (31 gols)
Participação em Copas:
2006 (5º lugar) – 4 jogos, nenhum gol

Foto: Getty Images

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